A auto-observação é a chave para o auto-conhecimento. E aquilo que nós observamos e aceitamos, sem resistência, pode ser transformado.
O texto abaixo, o qual escrevi há um ano atrás, me faz lembrar dessa verdade e me motiva a continuar o meu trabalho de auto-observação.
De repente eu pude perceber aquela voz sutil surgir na minha mente, como que sussurrando ao meu ouvido: “você notou que sua atenção está focada no lado positivo da apresentação da Luana, ao invés de estar procurando defeitos nela, como você costuma fazer?”
Esta pergunta me surpreendeu e me trouxe de volta à sala lotada de pais, alunos e professores da Escola Kissori, em Bad Kissingen. Sentados em círculo, descalços, sobre o tapete azul acolchoado que cobria todo o piso, todos observavam atentos a apresentação dos alunos. Cada um deles fazia um resumo da semana, descrevendo as matérias que tinham estudado, o que tinham aprendido e quais tinham sido suas dificuldades. Para cada nível de escolaridade era apresentado um resumo, desde a pré-escola até o ensino médio.
A Luana, minha filha, tinha acabado de apresentar em inglês o seu resumo, discorrendo as matérias e atividades, nas quais ela tinha trabalhado nos últimos cinco dias. Ela já tinha voltado a se sentar no tapete, quando uma das professoras chamou-lhe a atenção, dizendo que certamente nem todas as crianças tinham entendido seu resumo, já que muitas delas não falavam inglês.
Ela concordou balançando a cabeça levemente, levantou-se, voltou a postar-se diante de todos e traduzir seu texto para o alemão. Encostada na parede, eu olhava entusiasmada para minha filha e tudo o que eu sentia naquele momento era um grande orgulho. E por trás do orgulho, um forte sentimento de gratidão.
Eu me sentia grata por ver minha filha tão segura de si, falando para um público de pelo menos sessenta pessoas. Aquela mesma menina que ao entrar na escola, com seis anos de idade, de tão tímida, tinha se negado a subir alguns degraus de uma escada e ir de encontro ao seu professor. A mesma menina que durante muitos anos havia caminhado olhando para o chão, tamanha era sua timidez. A mesma menina que sempre se escondia atrás das outras crianças nas apresentações da escola, por ter medo de falar e cantar em público.
Sentada sobre meus joelhos e calcanhares, eu ouvia a sua voz. E para minha satisfação, não consegui encontrar as vozes críticas de outrora, apontando seus defeitos.
Até que por algumas frações de segundos eu ainda pude percebê-las passando de mansinho pela minha mente. Mas para minha surpresa elas não tinham mais poder sobre mim. Elas tinham se tornado apenas lembranças. Aquelas, que durante tantos anos, tinham sido minhas companheiras inseparáveis.
E enquanto eu observava o meu novo comportamento, a minha admiração pela Luana só aumentava.
Se, em outros tempos, eu teria estado atenta apenas à sua voz baixa e à sua postura um tanto curvada e tímida, naquele momento eu conseguia vê-la inteira, forte e corajosa.
Diante dos meus olhos a minha filha deixava de ser uma menina de treze anos de idade e se tornava uma moça segura, de um brilho todo especial.
Esta constatação fez meu coração de mãe bater mais forte e vibrar de felicidade. E a emoção daquele instante ressoou em mim por vários dias e neles eu pude constatar a consistência da minha mudança.
No último final de semana eu tive o prazer de participar do Congresso “Achtsamkeit” (Mindfulness) aqui em Bad Kissingen. Em um Workshop bastante informativo, oferecido pelos palestrantes Angel Hernandez e Mourina Latrache – fundadores da empresa Connected Business – uma frase de Angel me chamou a atenção: “A nossa capacidade de ser feliz é determinada pela forma como nós lemos o mundo à nossa volta. Ou nós lemos o mundo de forma positiva ou de forma negativa”.
Imediatamente eu me lembrei da experiência vivida na escola e pude compreender essa frase com mais profundidade. Eu entendi que se tivesse focado no lado negativo da apresentação da Luana, ou pelo menos julgava ser, teria perdido aquele momento precioso, de pura beleza.
O fato de eu ter olhado para aquela situação com um olhar compassivo, me permitiu conectar com a beleza interior da minha filha. E eu pude vê-la, pela primeira vez, com os olhos do coração.
Ao tomar consciência disso eu pude relaxar e agradecer, silenciosamente, por cada minuto daquele momento.